@luigienricky
Análise | 3% - Temporada Final
Atualizado: 26 de out. de 2020
Entre traição, algemas de tricô e muito drama, nos despedimos da primeira série brasileira da Netflix com muito orgulho do resultado. Confira nossa análise:

Time que realmente cumpre com o propósito de ser diverso agrega muito à representatividade que se torna cada vez mais importante nos dias de hoje
Um breve contexto da história
3% é uma série brasileira produzida pela Netflix e distribuída para o mundo todo, o que nos dá muito mais visibilidade lá fora do que jamais tivemos com as produções nacionais até agora e este é um ponto muito interessante se levarmos em consideração o quanto isso tem a agregar para nosso país no ramo de entretenimento.
No mundo pós-apocalíptico de 3%, as pessoas são divididas entre o Maralto e o Continente. Quem vive no Continente não tem comida, água, remédios ou qualidade de vida e estão fadados a viver na miséria para sempre. Sua única chance de mudar de vida é participar ̶d̶a̶ ̶p̶i̶o̶r̶ ̶e̶n̶t̶r̶e̶v̶i̶s̶t̶a̶ ̶d̶e̶ ̶e̶m̶p̶r̶e̶g̶o̶ ̶d̶o̶ ̶m̶u̶n̶d̶o̶ de um processo que dá a chance de viver no Maralto onde tudo parece um sonho. Só parece!
O problema desse processo é que apenas 3% da população do Continente consegue passar. Este método de controle populacional tem dado certo por mais de 100 anos, até que...

Entendeu o título agora?
Viva a Resistência!
Na primeira temporada somos apresentados a um grupo (e são eles que acompanhamos até o final) onde existem infiltrados da causa que pretende destruir o Maralto e acabar de uma vez com este processo excludente. No meio de tudo isso ainda surge um terceiro lugar chamado "A Concha", que acolhe aqueles que não acreditam mais no processo e a partir daí se forma uma guerra ainda maior com esses três poderes.
É fácil entender a contraparte do mundo real que a série consegue nos apresentar de uma forma muito inteligente e bem construída. As três primeiras temporadas conseguem construir um clima interessante e os episódios em que acompanhamos os processos dos jovens são repletos de muita adrenalina que fazem nosso sistema nervoso entrar um colapso.

Michelle (Bianca Comparato) se um dia te critiquei, não lembro!
Problemas trazidos do passado
Finalmente chegamos a temporada final, depois de todos os acontecimentos, personagens inseridos ou excluídos e todo o contexto político-social que se estabeleceu e está ainda mais latente neste final de série.
Tudo é extremo, tudo é 8 ou 80 e não da muito tempo de você julgar o que ta acontecendo no mundo de 3%, o que é muito legal pois você se vê obrigado a acreditar no seu julgamento sem muitas chances para analisar.
Algumas coisas que incomodavam nas temporadas anteriores infelizmente não foram corrigidas nesse final como os diálogos bobos de alguns personagens que faz você pensar que tá assistindo um episódio de Chaves, as vezes. Alguns problemas são tratados de forma negligente, como em um episódio em que os personagens da Concha vão até o Maralto para uma missão diplomática que mais parece uma excursão escolar.

Marcela e André criados para deixar viado e sapatão alvoroçados, e dá certo
Existem mais momentos que irão te deixar com raiva ao perceber que sua inteligência foi posta a prova de novo. Em um dado momento, Xavier (que é o maior zero a esquerda da série) se torna uma máquina implacável de passar em processos depois de um treinamento de menos de 24h que não convenceu ninguém.
O fato de o tempo todo sermos reforçados por André (Bruno Gostoso Fagundes) do quanto o novo processo administrado por ele seria ainda mais difícil da a ideia que ninguém vai conseguir passar, menos Xavier, pois ele se tornou o Goku Deus Supremo e conseguiu arrancar forças sabe-se-lá de onde para passar nas provas. Achei bem forçado.
Também se prepare para coisas acontecendo por conveniência como a figurante da primeira temporada aparecendo quando o personagem precisava com informações preciosas que ninguém nunca soube que ela portava.

Mesmo com a forçação de barra, Marco e ̶P̶e̶d̶r̶i̶n̶h̶o̶ Rafael tem os arcos mais interessantes dentre todos os personagens nessa nova temporada.
Fim dramático X Otimista
Ainda falando de bolas foras, essa não me incomodou tanto dado a como a série termina, mas foi uma perda de oportunidade dos roteiristas em mostrar para o espectador que aquilo que estava acontecendo realmente é uma questão de vida ou morte.
Em uma determinada cena, você pensa que metade do elenco morreu, no melhor estilo The Walking Dead com seu episódio da guerra das estacas que deu um ar renovado para a série pela quantidade de personagens mortos pelos vilões. Essa narrativa seria bem vinda e surpreendente mas no final das contas, tudo era um grande plano, todas as mortes foram forjadas e toda aquela motivação, inclusive do Xavier que poderia ser justificada, caiu por terra. Sem contar que o roteiro optou por seguir este caminho apenas para restituir a moral de uma personagem que estava manchada. Achei bem preguiçoso e decepcionante. Isso não quer dizer também, que ninguém morre na série!
E não posso deixar de mencionar as algemas de crochê usadas pela Concha. Vó corre aqui que é tendência! Sei que essa identidade visual foi importante para o espectador distinguir quem pertencia a cada lugar, mas a gente ta falando de algemas. ALGEMAS IRMÃO!!!

Antes de falar de coisa boa, não da pra ignorar o final medíocre que esses dois tiveram. Sendo protagonista e antagonista (muito bons por sinal) o final poderia ter sido melhor
Nem só de desgraça viveu a temporada final
Claro que a temporada final está recheada de muitas coisas boas. Em uma narrativa assustadora vemos como a elite se comporta quando é tratada como gente comum, pobre e de classe social diferente. Tudo é muito assustador e realista.
Minorias tratadas com respeito e dignidade como deve ser. Gente branca é a minoria no grupo principal de heróis e isso é um ponto positivo para série pois somos condicionados a achar que o normal é que tenhamos apenas um ou dois atores negros por elenco e sem LGBTQIA+, mas aqui o homem hétero branco é a unica minoria presente no elenco principal que tem personagens negra sapatão, indígena sapatão, negra médica, trans, etc. A representatividade se faz presente de uma forma muito linda.
A trilha sonora de 3% continua impecável como sempre foi, com músicas nacionais e letras marcantes sem contar com seus intérpretes.
Enfim, o desfecho conseguiu ser bom com um último episódio interessante onde nada foi deixado de lado, inclusive uma prova do processo para definir o controle do mundo após seus acontecimentos recentes e, tentando entregar uma mensagem otimista onde da um pouco de esperança para quem assiste, que se seguirmos no caminho correto e parando de segregar, dividir e excluir quem é diferente de nós, podemos conquistar muito mais enquanto sociedade.
